sexta-feira, 21 de junho de 2013



MEU MANIFESTO

            Ocupem. Ocupem tudo e ocupem agora. Sem líderes, sem partidos. Porque tudo isso que exigem de vocês é farsa, é amargo e infrutífero. Quando pedirem propostas, objetivos e programas, lancem de novo esse grande NÃO que inundou as ruas. Se mentirem, mantenham a verdade mais clara: não seremos escravos para sempre. Se eles querem que vocês sejam pacíficos e tributáveis, comedidos, bons cidadãos, que eles abram mão primeiro dos cassetetes. Porque cada soldado deveria estar do outro lado da barricada, e não defendendo banqueiros, políticos e patifes. Esta cidade que vocês sustentam não pertence a ninguém, mas a todos. Suas ruas são artérias que crescem numa única pulsação: Amazonas, Praça Sete, Afonso Pena, Assembleia, Praça da Liberdade. Pra onde corre esse rio? Quem são esses sete? Talvez os sete samurais... E o tal Affonso Penna, distante jurista de belos bigodes... Assembleia de quem, pra quem? Mas LIBERDADE não há quem não entenda: é o que faz dois e dois serem quatro.
            E eu que pensei que não veria uma revolução... eu que só ensino como foram as revoluções, porque aconteceram as revoluções, porque falharam as revoluções... Eu quero agora testemunhar: sim, eu vi. Eu vi durante quatro noites a minha cidade intransitável, vi pessoas que urravam e eram perigosas. E tive medo delas. Mas as amei. E talvez morresse com elas. Essas perigosíssimas pessoas que não queriam meu dinheiro, não queriam minha mulher, não queriam minha alma. Tesas e alertas, como anjos de Deus na Praça Sete de Belo Horizonte, elas apanhavam e se levantavam de novo. E RUGIAM. Sentiam que nada vale a pena neste mundo se não envolver terror e virtude.
            Acabo de ler agora que alguém em algum absurdo gabinete resolveu abaixar o preço das passagens de ônibus. Cinco centavos a menos. Ou dez. Ou quinze. É incrível como o poder pode ser ridículo. Porque os que estão aí arriscando o pescoço não lutam para que seja mais barata a cotidiana entrega ao trabalho. É outra coisa: os brasileiros estão cansados. PROFUNDAMENTE cansados de serem palhaços. Eles sentem que chegou a hora de se divertirem.
            “Se tudo voltasse a ser como antes”, pensam, saudosos, os nossos políticos. Eles esperam, ansiosos, que vocês votem. Que celebrem o “milagre da democracia”, o que neste nosso Brasil significa: ser currado de quatro em quatro anos. Sim, eles querem que vocês se comportem, sejam bom meninos. Mas ninguém previu a explosão na avenida, o grito, a quantidade, a verdade: NÃO TEMOS MEDO. Ó meus irmãos, nestas horas tão fundas e tão mágicas em que ouço os sons da doce baderna, peço ao Deus Escondido que nos dê mais quarenta dias de congestionamentos, mas quarenta dias de polícia nas ruas em dúvida entre bater e apoiar, mais quarenta dias de cusparada na cara daqueles que se dizem representantes do povo. Mais quarenta dias e uma bela greve geral revolucionária no meio disso tudo. Aliás, se perguntarem o que vem em seguida, digam (pra meter medo): GREVE GERAL. Greve total. G R E V E: só essa palavra já vai deixar os Tribunais incomodados, com terríveis úlceras naqueles velhos estômagos acostumados a digerir as estranhas entranhas da sociedade que, confiando na lei, construímos cegos e mudos. Alguém ainda se lembra que GREVE significa não fazer nada? Ficar à-toa, ir pra Praça Sete, pra Praça da Liberdade, deixar o patrão esperando, fincar pé na última dignidade que te resta, responder EU PREFERIRIA NÃO!
            Eu sou apenas um professor de Filosofia do Direito que ficou cinquenta e dois minutos parado no trânsito (no mesmíssimo lugar) graças à manifestação de vocês. O mais engraçado é que eu estava indo à Faculdade de Direito da UFMG para dar uma aula sobre “estado de exceção”. Mas lá dentro do carro senti que eu e meus alunos éramos a exceção num universo de gente mal-tratada, explorada, enganada. E cada segundo daqueles cinquenta e dois minutos valeu como se fosse o canto que ouvi quando, finalmente, cheguei à sala de aula. Era uma música tão simples, tão boba, tão... fora de moda. Da janela eu escutava: O POVO UNIDO JAMAIS SERÁ VENCIDO. Experimentei um pouco de vergonha, um pouco de orgulho. Às vezes eu queria estar com vocês apanhando e batendo, lá no coração das coisas.
            Ó meus irmãos, pela PRIMEIRA VEZ em 34 anos eu tenho orgulho de ser brasileiro.



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