O LONGO PERCURSO DE ANDITYAS SOARES DE MOURA
Quantas vezes tenho voltado a Algo Indecifravelmente Veloz - Antologia Poética de Andithyas Soares de Moura (S. Mamede de Infesta, Edium Editores, 2007)? Sempre no intuito de compreender os poemas perpassa¬dos pela cultura Clássica, com seus versos raros, de musicalidade pró¬pria, de lirismo denso, de ambientes arcaico-modernos.
Lêem-se, com as palavras do poeta,os surtos do despertar da Lín-gua Portuguesa, tendo o autor ousa-do expressões galegas ou medievais, no sen¬tido de carregar os po¬emas das remissões de momentos áureos da atmosfera lírica. Por mais ingênuos pare¬çam os cantos, com suas anáforas, seus rondós, repetições, mais transmitem a es-sência da criação poé¬tica, a recolher nos ver¬sos a síntese das pai¬xões humanas. Trazem a inocência e o frescor da infância cul¬tural do ser humano.
E como o faz o poeta Andithyas Soares de Moura, inspirado tradutor e erudito ensaísta. Há trechos da Antologia em que o leitor se concentra e tem a noção veloz da eternidade da poesia. Desde os albores, até hoje, o que se buscam são respostas às perguntas acerca do enigma da condição humana. A qualidade polissêmica dos signos, a cogitação profunda acerca das circunstâncias dos dias, a complexidade sem termo da men¬te, a articulação insofrida ao redor da consciência da morte, os apelos energéticos do amor e da vida, tudo se aglutina para que a linguagem da beleza estética acuda às exigências existenciais e às intencionalidades do espírito. Trata-se de buscar a paz na guerra dos motivos pessoais e coleti-vos. Ou, talvez, definir o território da poesia no qual se lavam as carênci¬as e inibições.
O lado aparentemente poliglota do poeta, artesão caprichoso, conglo¬mera reminiscências do ser profun¬do do Ocidente: ditos latinos, epítetos galaico-portugueses, glosas castelhanas, radicais gregos, monumentalização dos temas, mitificação do pobre cotidiano.
É na última cláusula que o passado remoto se remoça e perfila as flores do mal com que Baudelaire atualizou a herança e deu ao dia-a-dia urbano o aroma da poesia. Andithyas não foge aos temas da modernidade por amor do antigo. Vejamos parcela do poema "Caminho da mãe" em que o tom confessional guarda as alturas das conexões culturais: "Não nos fa-lamos muito.! Nos jardins de Minas/ -agreste Minas onde/ mamãe me pa¬riu - / se ensina que a palavra! só não vira equívoco/ quando é pouca! e sussurrada." (ob. cit., p. 125).
É largo o repertorio da Antologia. Eis que se abre aos olhos do bom leitor a pa¬ródia audaz de uma Cantiga D'Amigo: "Em Romaria, Rumo à Ermida de Mestre Requeixo.» Fervente declara¬ção de amor na voz femini¬na. A que se segue, na cole-tânea de Andithyas Soares de Moura, a ingênua "Troba D'Or» armada em cinco subtextos. E na seguinte co-leção de inéditos (daquela pu¬blicação de 2007), o poeta tem artes de glosar em ter¬mos arcádicos a bela "Canção do Pastor», modernizada pelo andante de Mozart e pelo erotismo descritivo. E a Grécia se insinua na «Inscrição Funerária Órfica» (ob. cit., p. 142).
São inúmeras as opções de leitura. Exemplo: "0 Evangelho de Judas" e, adiante, a "Elegia a William Blake". E os títulos não correspondentes dos textos ("Sinos", "Houve tro¬voada", etc)? E os (sub) poemas à direita do texto impresso? E as dores do mundo a florir por entre as péta¬las, os cães e os cavalos? E a originalidade das metáforas? E o simbolismo oculto? E os títulos de gramaticalidade duvidosa ("Raposamente") ou de puro conteú¬do poético: "Anos y anos trabajé para hacerte/ antes de oír un solo sonido de tu alma"? E a arte da não-poesia:
"Língua do Fogo. do Não"?
Do poeta Andithyas muitos são os caminhos. A sua Antologia trans-pira as encruzilhadas da Literatura hodierna, um verdadeiro arco-íris a ligar a aurora ao crepúsculo. Uma tra-ma da Vida com a Morte, fragmentos de uma totalidade perdida.
Fábio Lucas é membro da Academia Paulista de Letras e da Academia Mineira de Letras.
Procurei e não encontrei. Por favor, me indique um lugar para comprar.
ResponderExcluirEsta antologia está esgotada, infelizmente... Mas você pode achar na livraria cultura o meu novo livro de poemas, AURORAS CONSURGEM.
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